quarta-feira, janeiro 14, 2004

Santa Maria ou a concepção poética do abandono

Santa Maria também é moldada por mitos que ainda não conseguiu, ou não desejou, abandonar: o mito do aeroporto, como factor de progresso e riqueza; o mito da emigração, como exemplo de liberdade, oportunidade e independência económicas; o mito do poder político como Messias.
O aeroporto colonizou a ilha, obrigando a perceber que as fronteiras de uma certa ideia de modernidade poderiam ser abertas. Durante dezenas de anos foi o expoente da verdade mariense sobre o futuro. Qualquer destino só poderia passar pelo aeroporto. Criou-se a típica dependência, dolorosa, tendo em conta que as alternativas nunca foram sérias.
O mito da emigração mariense é muito antigo, violentamente anterior ao século XIX. Do Brasil à corrida do ouro na Califórnia, é no sonho da partida que se realizará a construção de uma liberdade de acção, a oportunidade de fugir ao destino e a utopia de voltar um dia. Assistir a um império em Hudson, diz-nos mais sobre a verdade poética de Santa Maria do que qualquer amante apaixonada.
O poder político se é confuso sobre Santa Maria, estranho com as suas gentes, quase sempre mal preparado, foi gerindo alvoroços, tentando imitar o fenómeno português da cultura do desmazelo. Também aqui se inventou uma subordinação, novos expedientes de adiamento, pecado com misérias e glórias pouco claras.
Ilustres marienses: o que falta para se cumprir Santa Maria?
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